Fim de ano é f***, mas estamos de volta!

No set, diretor é rei – bom, pelo menos era. A imagem quintessencial de diretores como Cecil B. DeMille gritando ordens via um megafone está no retrovisor de Hollywood, ninguém mais respeita este tipo de atitude, mas não significa que a hierarquia no set deixou de existir. Na “dança” do set profissional, ninguém pisa nos dedos de ninguém. Cada cargo tem as suas obrigações e mesmo se você for instruído e capacitado para exercer a função do seu parceiro, você é apenas encarregado da sua parte. Se você for o gaffer você não encosta na câmera e se você for o AC você não meche nas luzes. Mas o que é um gaffer e um AC?

Diretor – Como todos sabem este é o manda-chuva atrás apenas do produtor – em alguns casos – mas no set de filmagem nem o produtor está acima do diretor. Aliás, é beneficial ao produtor não intervir no set de filmagem, a pior coisa que você pode fazer para o filme é questionar a autoridade do diretor na frente da equipe (crew) e dos atores. Um bom filme normalmente é um produto da visão única do diretor, mesmo quando o diretor não é o escritor, pois o filme é a interpretação dele indiferente do que o escritor tem em mente.

Mesmo diretores que trabalham com diversos cinematógrafos podem ser considerados auteurs. Por exemplo, indiferente de quem é o DP nos filmes do David Fincher você irá notar um distinto estilo característico em todos os seus filmes.

Mas o trabalho do diretor não se resume apenas ao set, eu diria que o trabalho mais difícil está na pré-produção onde comumente o diretor é um co-produtor, procurando talento, organizando uma equipe, locais, etc. Como o David Fincher disse, “Se você não estiver de pé as seis da matina “scouting” – procurando um local – para o seu filme com dez graus negativos no termômetro, você não é mais um diretor.”

Assistente do Diretor – Agora sim, esse é o cara! O 1st AD (First Assistant Director) é responsável por toda a comunicação entre a equipe e o diretor, e o elenco e o diretor. Em alguns casos os atores não são permitidos a falar diretamente com o diretor, e muitos sentem, justificadamente, que o filme foi dirigido pelo AD. Claro, que em um set Hollywoodiano existem um segundo e terceiro AD e mesmo um PA (Production Assistant) que é considerado o capacho do set – quem trabalhou disso, sabe. O 2nd AD pode exercer o cargo de claquetista durante as filmagens e o 3rd AD de supervisor de roteiro (script supervisor), que é… auto explicativo.

Antes do diretor bradar “Ação!” você vai ouvir o AD dizendo a seguinte chamada (conhecido aqui como, “calling the roll”),

AD: Quiet on set! (Silêncio no set!)

AD: Roll Sound! (Roda o som!)

Sound-mixer: Speed! (Rodando!)

AD: Roll camera! (Roda a câmera!)

Cameraman: Rolling! (Rodando)

AD: Mark it! (Claquete!)

“Clack!” – Barulho da claquete.

Apenas então o diretor grita, “Ação!”

Cinematógrafo – Se o mundo soubesse da importância do cinematógrafo, ele estaria usando a coroa no lugar do rei. Como o personagem do John Goodman diz no filme Argo (2012) de Ben Affleck, “É possível ensinar um macaco-reso a ser diretor em um dia.” É uma piada, mas existe um fundo de verdade. Se eu ou você aparecer no dia da gravação de um filme, onde todas as engrenagens já estiverem em movimento, o seu trabalho seria praticamente gritar, “Ação!” Não sei se é possível ensinar um macaco a falar, mas existem diretores mudos.

Existem também, diretores que assumem a responsabilidade da fotografia em seus filmes e acreditam que você apenas pode escrever, “a film by” Fulano, se o Fulano foi responsável pelo look do filme.

Se você for nos créditos dos filmes do Steven Soderbergh, você irá encontrar um tal de Peter Andrews na posição de cinematógrafo, um de seus pseudônimos. Em contrapartida, há também diretores como Kevin Smith, que passou vergonha no set de Tiras em Apuros (Cop Out, 2010) quando Bruce Willis perguntou a ele qual lente seria usada na próxima cena e Smith não soube responder.

Resumindo, cinematógrafo ou diretor de fotografia (DP ou DoP) é o artista responsável pelo desenho da iluminação, composição das cenas – mise-en-scène e enquadramento.

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[highlight color=”yellow”]Cinematografia do Roger Deakins em 007 – Operação Skyfall (2012)[/highlight]

Gaffer (Chefe da Iluminação) – O gaffer trabalha diretamente abaixo do DP. Assim que o cinematógrafo tem o plano da iluminação pronto, ele passa para o gaffer que faz o desenho virar realidade.

Esta posição demanda um conhecimento extensivo dos tipos de luzes existentes para produzir um efeito desejado. Por mais simples que uma cena seja ao olho nu, existem dez ou mais luzes sendo usadas para criar o ambiente que, caso for bem executado, irá parecer natural. Da luz do sol entrando pela janela às sombras, curiosamente inexistentes. Uma das ferramentas principais do gaffer é o medidor de luz – que irei revisar em breve.

Os ajudantes do gaffer são chamados best-boys (ou BB), são eles que fazem o trabalho pesado (rigging) de carregar e montar as luzes designadas pelo chefe-iluminador e “grippage” pelo key grip.

Key Grip (Chefe-Maquinista ou Chefe-Eletricista) – Os dois títulos de chefe são apropriados, pois o key grip tem duas funções, o de auxiliar o gaffer na parte elétrica da iluminação – como saber qual amperagem, voltagem disponíveis para que as luzes não explodam os fusíveis do local e o de maquinista, quando houver uma máquina envolvida, como um dolly, onde um dos grips se torna o dolly grip – a pessoa responsável por empurrar o “carrinho” nas trilhas. O key grip e grips ajudam também na configuração das luzes com flags (bandeiras), difusores, cookies e gels.

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[highlight color=”yellow”]Desculpe pela qualidade da foto, foi tirada com um celular antigo.[/highlight]

Cameraman (Operador de Câmera) – O cameraman tem, o que muitos consideram, o trabalho mais divertido no set. Este profissional tem que estar afiado na linguagem de enquadramento e movimentos de câmera antes de sentar no banquinho do dolly. Quando o diretor disser, “Okay, nesta cena vamos começar em um two-shot, depois um tilt-up para um CU no ator principal, um swish-pan para a janela assim que ele terminar o diálogo e finalizando com um dolly-in no prédio de fora.”, é melhor você não perguntar, “Desculpe, como é que é?” – Não se preocupe, estarei falando sobre movimentos de câmera em breve em um dos próximos artigos.

O assistente de câmera (AC) é o encarregado por montar a câmera (lentes, tripé, monitor, etc) junto com o 2nd AC. Durante a gravação, o AC se torna o focus-puller, com o trabalho de alterar a focagem quando necessário. Girar um botão parece um trabalho trivial, mas tente manter foco no olho com um puxador de foco sem fio enquanto acompanhando operador de Steadicam em movimento com uma profundidade de foco raso.

Production Designer (PD) – A maioria dos cinematógrafos consideram composição mais importante que iluminação e câmera. PD inclui toda a parte de decoração, dos talheres na mesa em uma cena em um restaurante ao tipo de tapete de uma casa, cor da parede e os objetos espalhados pela cena. O figurinista, que cria os figurinos – roupas, fantasias, o cenógrafo, que monta os cenários e o maquiador, que faz a maquiagem – Duh! – estão todos sob o comando do PD.

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[highlight color=”yellow”]Dan Hennah, PD do O Hobbit – Uma Jornada Inesperada (2012).[/highlight]

Boom Operator – Este é o camarada de quem sinto mais pena. Em um set amador, ele normalmente nunca trabalhou como operador de boom e está prestes a descobrir o significado de espasmo muscular. O boom-operator ou sound-mixer é reponsável pela gravação do som no set com um microfone preso em uma vara (boom) e um cabo XLR conectado ao gravador. Apesar desta posição ser delegada a quem está começando, ela é essencial. Como já escrevi aqui antes, as pessoas perdoam um vídeo com uma imagem de baixa qualidade mas crucificam aqueles com som ruim.

Unit Production Manager (UPM) – O gerente de produção do set organiza o orçamento do filme durante a produção e trabalha com o produtor fora do set para manter o controle do custo. O UPM também conversa com o AD no desenvolvimento do cronograma, pois cada dia em um big-budget set chega a custar cem mil dólares ou mais.

Wrangler – Sempre que houver animais no seu set, será necessário um profissional que seja treinado para isso. Eu não sei quais são as leis brasileiras, mas acredito que deva existir uma cláusula semelhante. O wrangler é também encarregado de cuidar de objetos que necessitam de atenção.

Aqui vão algumas dicas:

.  Se você não estiver pagando a galera, esteja ciente disto e providencie um banquete com frutas, refrigerantes, petiscos e sanduíches em um local separado durante a produção – você deve ao menos isto a eles.

.  Antes de delegar, faça um esforço e exerça todas estas funções, apenas assim você irá entender as suas demandas.

.  Nada me deixa mais impaciente do que ter uma fila de crew members sentados nos cantos, contando os minutos para desmontar o set e ir para casa – então, lembre-se da palavra proporcionalidade. Você provavelmente não precisa de vinte pessoas te ajudando a fazer o seu primeiro curta de dez minutos. O seu PD, pode ser o seu cenógrafo, figurinista e – se tiver experiência – maquiador. O seu gaffer e key grip podem trabalhar de best boy e grip, ajudando um ao outro.

.  Se você é o 2nd AD e o seu filho de dezesseis anos for o 1st AD, você é subalterno a ele no set de filmagem. Esqueça o mundo real, outro dia você quebra os dentes dele, longe das câmeras – no pun intended.

.  One Man Crew – É a minha posição preferida onde você é um canivete suíço. Antes de perder o tempo de outras pessoas, primeiro perca o seu tempo em projetos menores.


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